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Religião e Espiritualidade: Compreendendo as diferenças e semelhanças.

uma mulher sobrenatural no trono

Religião e espiritualidade podem ser a mesma coisa? Têm conceitos excludentes? Os dois conceitos se estabelecem através de relação de causa e efeito, trazendo significado para o ser humano na sua jornada pela vida.

Independente se você, leitor, já parou ou não para pensar sobre isso em algum dia da sua vida, vai concordar comigo que se trata de um assunto que não dá pra ignorar. Religião e espiritualidade, o que são? significa o quê mesmo? São a mesma coisa? Eu tenho certeza que você até já se pegou imaginando algumas coisas a respeito, mas não dedicou muito tempo para tentar compreender. Não se culpe, você, eu e a maioria das pessoas do mundo não fez muita questão disso não.

Parando ou não para pensar no assunto, uma coisa é certa: você vai se identificar com o fato de mesmo não falando sobre isso, sentimos como se já soubéssemos, como se não precisasse falar mais sobre essas coisas complicadas com outras pessoas, a gente simplesmente entende; ou meio que entende; ou meio que a gente sabe do que se trata, assim, automaticamente. Não parece um tema completamente desconhecido por nós. Tanto que, se alguém, do nada, te abordar e perguntar algo ou pedir sua opinião sobre religião, espírito, transcendência ou algo similar você não responde com “não sei”, assim de cara, simplesmente responde que “depende, né… é complicado”. Você pode até não querer responder, mas poderia expressar suas ideias a respeito se quisesse e eu estou muito certo disso.

Eu penso que isso acontece porque esse assunto nos é introduzido logo na mais tenra infância. Na verdade, pense em você como um exemplo. Mesmo antes de nascer, esse conceito já lhe é introduzido ainda na barriga da sua mãe. Seus pais oram, rezam, abençoam e pedem às forças divinas para que você venha a esse mundo com saúde – alguns pedem até beleza, sorte e inteligência. Querendo ou não, gostando ou não, agora que você, leitor saudável, inteligente, belo e sortudo, já é um adulto sabedor de muitas das coisas desse mundo (também conhecido como vale de lágrimas), não pode ignorar o fato que sofreu esse tipo de influência de seus pais ou parentes próximos.

Aí o leitor responde: meus pais eram ateus, eu sou ateu, minha família toda é e sempre foi. Tá bom, acredito e respeito sem problemas. No entanto, perceba que o mundo é muito grande, ao passo que também é pequeno – calma, eu não tô maluco – ao ponto de todas as pessoas existentes nele precisarem socializar. E aí, não tem como. Através de terceiros, o tema religião e espiritualidade vem e bate à sua porta. Vizinhança, escola, trabalho e relacionamentos amorosos, ou seja, você está cercado de pessoas multiculturais e multi religiosas. Considero esses quatro fatores como determinantes para toda sua formação como pessoa, e elas, fundamentalmente, ignoram você e sua cultura familiar no que diz respeito aos conceitos religiosos e afins.

Bem, o que quero dizer com tudo isso é que não tem como fugir, o assunto não nos é estranho porque já temos contato com ele desde antes de termos formado nosso caráter. Antes mesmo de saber se é ruim, bom, importante ou não, sempre fomos influenciados por religiosidades, tradições, fé e espiritualidades. Podemos até nos afastar e não comentar ou simplesmente não dar nenhuma prioridade, mas que reconhecemos e sentimos essas coisas intangíveis de alguma forma. Isso não dá pra negar, e respeito as opiniões em contrário.

Então, se é um assunto comum a todos, se reconhecemos a importância dele, nada melhor do que conhecer um pouco mais, expandir o pensamento. Isso pode ajudar muito na nossa caminhada. Por isso, vamos falar sobre religião e espiritualidade, de uma forma macro, em seus conceitos, sem detalhar muito. Podemos até fazer esse detalhamento em outro artigo, então vamos iniciar apenas com o objetivo de esclarecer a diferença e semelhanças desses dois conceitos.

Muito importante esclarecer que religião e espiritualidade tem a ver com a busca pela compreensão do transcendente, do significado e do propósito. Inclusive, veremos que esse é o significado elementar. A busca por esse entendimento tem sido um aspecto fundamental da experiência humana ao longo da história (história inclusive da sua família e de seus antepassados mais distantes, talvez). Em meio a essa busca, emergem os conceitos complexos de religião e espiritualidade, frequentemente considerados interligados, mas com distinções essenciais. De início, vamos identificar alguns pontos fundamentais de cada um dos conceitos, o que é necessário existir para caracterizar cada um. Isso facilitará a compreensão:

Pontos principais sobre Religião:

  • Mantém estruturas institucionais (igrejas e/ou templos);
  • Possuem instituídos os líderes religiosos e uma hierarquia funcional de membros;
  • São baseadas em textos sagrados (bíblia judaica e cristã, o corão, etc.)
  • Referenciam-se de textos/livros que guiam e moldam os pensamentos e condutas de seus membros.

Principais pontos identificados na Espiritualidade:

  • Ela é de relacionamento individual e pessoal para consigo, com outros e com o transcendente;
  • Focada na busca por propósito, transcendência ou força superior de maneira solitária, de maneira própria;
  • Pode ou não estar dentro de um contexto religioso;
  • Normalmente é acompanhado por práticas de cunho pessoal.

Lendo assim, dessa forma estruturada e em forma de lista, até parece fácil perceber que há sim uma diferença, pelo mesmo lógica, estrutural e comportamental entre os dois termos. No entanto, é necessário desenvolver e aprofundar um pouco mais. Veremos que há uma sinergia facilmente sentida ou percebida por qualquer pessoa.

A religião, geralmente, se refere a sistemas organizados de crenças, práticas, rituais e dogmas compartilhados por um grupo de pessoas. Ela, muitas vezes, fornece estrutura institucional e diretrizes éticas. Isso nos leva, automaticamente e de forma bem simplista, a lembrar das religiões ou igrejas que tanto conhecemos: a católica, a evangélica, o espiritismo, a famosa “macumba”, não é isso que acontece? Pois isso se deve ao conceito de instituição, conceito esse que temos mais facilidade de associar.

Se religião está, de alguma forma ligada à existência de instituições, então podemos identificar e contabilizar as religiões? Pois bem, a resposta é sim e não ao mesmo tempo – relaxa leitor, ainda não estou doido. É que não é tão simples assim. É até possível contar quantas religiões há, mas será necessário estabelecer os critérios para definir religião. Digo isso porque existem muitas práticas religiosas diferentes, o regionalismo conta muito, além das características de grupos étnicos, as seitas, tradições indígenas, etc. Não vamos detalhar isso aqui. Mas se fosse pra contar, usando critérios básicos da nossa listagem, teríamos, no Brasil, por exemplo, as religiões: Catolicismo, o Protestantismo, o Candomblé, a Umbanda e o Kardecismo, pelo menos. Esse último deve ser analisado em específico, pois não se trata de uma religião propriamente dita, mas é assunto para outro artigo.

Por outro lado, a espiritualidade é mais individual e pessoal, relacionada à busca por significado, conexão com algo maior e transcendente, podendo existir dentro ou fora do contexto religioso. Da mesma forma que no caso da religião, também é possível identificar muitas das práticas espiritualistas. Muitos a praticam sem a necessidade de templos, textos que servem de guias ou regramento ético comportamental. No brasil também se reconhecem muitas dessas práticas como a Meditação, Yoga, Astrologia e Numerologia, Caminhada na Natureza (isso mesmo, muitos a praticam como uma busca espiritual), Leitura Espiritual, Mindfulness, etc. Note que também não é possível contabilizar, pois novamente, precisaríamos de estabelecer critérios que não são concretos, pois a prática da espiritualidade é pessoal, se lembra?

Para deixar bem claro os conceitos primários entre religião e espiritualidade, recorremos a dois autores do tema: Carl Jung, em suas obras, distingue a religião organizada da busca pessoal por significado, enfatizando a importância da jornada interior na busca da verdade espiritual. Ao mesmo tempo, Rudolf Otto destaca a experiência do “numinoso”, uma experiência direta do divino, diferenciando-a das práticas e dogmas religiosos.

De todo modo, não é possível dissociar a religião da espiritualidade. A história da humanidade nos prova isso. Mesmo com a ajuda de livros, de autoridades religiosas, líderes, práticas espirituais e templos, sejam de que porte for, não impedem ou excluem, de maneira nenhuma, a relação integrada entre elas (a religião e a espiritualidade). Espiritualidade e religião são sinérgicas e existem numa relação de causa e efeito. São complexas e podem variar dependendo da importância dada à estrutura religiosa, à liberdade individual e à interpretação pessoal dentro de uma tradição, sendo ela religiosa ou não.

Por exemplo, podemos verificar a religião influenciando a espiritualidade quando os ensinamentos religiosos sobre dogmas e regras moldam a compreensão espiritual do indivíduo. Muitas vezes, muitas pessoas só têm contato com a espiritualidade dentro de uma igreja, estudando um conjunto de regras, e de forma coletiva com que, em comum, congregam – a catequese católica é um caso. Na via contrária, a espiritualidade pode influenciar, e muito, a religião quando as pessoas dentro de uma tradição religiosa reinterpretam, reavaliam ou enfatizam certos aspectos espirituais, forçando mudanças na prática religiosa institucionalizada. Novas interpretações espirituais, com ênfase em certos aspectos da fé ou práticas mais individualizadas podem afetar a forma como a religião é praticada dentro de uma comunidade ou tradição. Na verdade, percebe-se que as grandes religiões mudaram muito ou se adaptaram de acordo com as crenças espirituais de uma coletividade.

A experiência do sagrado ou do divino é um elemento central tanto na religião quanto na espiritualidade. Essa é a parte comum e fundamental entre as duas. Religiosos e espiritualistas seguem junto a busca do transcendente, de algo inegável em todo ser humano. Discute-se, portanto, a importância dos rituais na criação de uma experiência religiosa, enquanto também se enfatiza, sem dúvidas, a busca humana por significado espiritual como um fator crucial em todas as tradições religiosas. Essa unidade de significado ocorre de forma que não importa se você está dentro de uma igreja ou praticando mantras na meditação, você e os demais, todos, procuram uma unidade maior como o rio procura o mar.

Embora existam diferenças culturais e rituais entre várias tradições religiosas, vários autores destacam as semelhanças subjacentes, como a ética, a busca por transcendência e noções do divino. A compreensão da unidade subjacente entre diferentes tradições religiosas é vital para promover a compreensão e a tolerância. Ken Wilber e outros teóricos abordam o crescimento espiritual como um processo de desenvolvimento da consciência, enfatizando como as pessoas evoluem em sua busca por significado, compreensão e transcendência ao longo do tempo. Essa evolução é um aspecto intrínseco da experiência espiritual e religiosa.

Entre as semelhanças e diferenças entre espiritualidade e religião, não se pode, caro leitor, deixar de lado aquilo que pode ser o senso comum de maior importância quando se trata o tema. Mesmo que você pratique uma religião formal e conservadora, mesmo que seja praticante do espiritualismo individual vai concordar que em ambos, o estabelecimento e/ou o amadurecimento da Moral e da Ética, como entidades essenciais da vida humana civilizada, é amplamente ensinado, motivado e enaltecido como qualidades do indivíduo para consigo e para a sociedade.

Religião e espiritualidade, em suas práticas sérias e devotas (no caso, devoção significando que sem a prática recorrente e ordenada de qualquer processo não se chega a lugar nenhum e nem se atinge nada), se juntam à evolução cultural, social, à filosofia e às tradições seculares para moldar os sistemas de valores do ser humano. Mesmo que muitos códigos morais e éticos já existissem antes do surgimento das grandes religiões, a religião e a espiritualidade acabaram por traduzir, e estabelecer e fortificar esses sistemas de valores, principalmente nas sociedades ocidentais.

Em suma, religião e espiritualidade, embora distintas nos seus termos, estão entrelaçadas na experiência humana, moldando nossa compreensão do transcendente, do significado e da moralidade. A compreensão das diferenças e semelhanças entre esses conceitos é crucial para promover a harmonia, compreensão e respeito em uma sociedade diversificada. A busca por significado e conexão com algo maior continua a ser uma jornada fundamental para a humanidade.

Depois do que foi apresentado, voltamos aos nossos pensamentos sobre conhecer o significado desses conceitos e se isso tudo tem algum sentido em nossas vidas cotidianas. Como vimos, religião está presente o tempo todo na nossa história. Muito do que pensamos e somos se originam justamente dos conceitos que temos sobre espiritualidade e religiosidade. Qualquer um que diga “vá com Deus!” ou a nossa avó que lhe fale: “Deus te abençoe, meu filho!”, já soa natural para o ser humano, acreditando ou não na veracidade das consequências desses dizeres.

Este artigo apenas discutiu, de forma bem superficial, os conceitos entre religião e espiritualidade. Muitos conceitos, ou outros pontos referenciados aqui merecem de análises e estudos específicos, pois são muito abrangentes. Basta saber o quanto a literatura é abundante sobre o assunto. Até nas mesas de bar é possível encontrar um arcabouço gigante de informações a respeito, contrariando exemplarmente os que dizem que religião não se discute. Se discute sim, amigo, e como se discute. Das grandes bibliotecas, templos e, passando por bares e esquinas. Religião e espiritualidade estão presentes inequivocamente.

Leitura complementar:

Rudolf Otto:

Autor de “The Idea of the Holy” (A Ideia do Sagrado), Otto introduziu o conceito de numinoso, uma experiência de contato com o sagrado. Ele distingue entre o sagrado (ou religião) e o numinoso (ou experiência espiritual direta), destacando a natureza do encontro com o divino.

Carl Jung:

O psicólogo suíço Carl Jung explorou a espiritualidade, a religião e a psique humana. Ele discutiu a relação entre a religião organizada e a busca por significado pessoal, enfatizando a importância da jornada interior na busca da verdade espiritual.

Mircea Eliade:

Eliade, em obras como “O Sagrado e o Profano”, examinou a natureza do sagrado e dos rituais religiosos. Ele enfatizou a importância dos rituais na criação de uma experiência religiosa e abordou as diferenças entre o sagrado e o profano.

Karen Armstrong:

Armstrong, autora de “A History of God” (Uma História de Deus), explora as semelhanças entre várias tradições religiosas e defende uma abordagem mais compreensiva e tolerante das religiões, destacando a busca humana por significado espiritual.

Ken Wilber:

Wilber é conhecido por sua abordagem integral, que procura integrar várias perspectivas, incluindo as religiosas e espirituais. Ele explora a evolução da consciência e a relação entre religião, espiritualidade e desenvolvimento humano.

Por Rod (Veja Claramente)